Eu tinha planos. Minha vida
estava caminhando bem. Eu estava contente. Mas carregado de mágoas do passado
das quais nunca tinha lidado. Perdas que nunca tinha superado. Eu buscava
aquele turbo para minha auto-estima e minha auto-aceitação. Eu acreditava que para eu me aceitar eu
precisava encontrar alguém que me aceitasse antes. Ou seja, eu estava ferrado.
E quando estamos bem, encontramos alguém que está bem. Quando estamos ferrados
encontramos alguém tão ferrado quanto. Eu a encontrei, uma garota coreana de 25
anos. Ela estava realmente ferrada, sendo julgada por todos e expulsa da escola
do qual estudávamos. Eu queria continuar com ela então propus irmos ao Brasil.
Ela aceitou, mas semanas antes descobri ela que mantinha um relacionamento com um
homem 30 anos mais velho que ela. Aquele foi apenas a primeira cicatriz que
esse pobre coração ganhou. Eu a perdoei, pois achava que precisava dela. Exigi
que revelasse à verdade ao sujeito e cortasse contato com ele. Ela enviou o
e-mail na minha frente, para um endereço que não era o dele, pois ele nunca
recebeu a mensagem.
Viemos ao Brasil. Eu a introduzi
na minha família. Fui seu intérprete. A provi de casa, comida, roupas, conforto
necessário... Pagava 100% das contas. A levei para fazer cursos. Dei um gato a
ela para fazê-la companhia enquanto eu trabalhava. Dei a ela um livro em branco
e a cada dia escrevia lá uma qualidade sua para que sua auto-estima aumentasse.
Deixei meus amigos para dar 24 horas de atenção a ela. A protegi de todo perigo
e de qualquer um que ficasse contra ela. Corria na farmácia às 2 da manhã
quando ela sentia alguma dor de cabeça ou tosse. Ia com ela às 5 da manhã no
posto médico para fazer exames de doenças que ela só tinha em sua imaginação.
Deixei de lado minha vida social,
minha auto-estima, meu cuidado com minha própria saúde física e mental, minha
família, meus hobbies, meus gostos e meus sonhos.
Enquanto isso ela me julgava incompetente,
inconfiável financeiramente, irresponsável e sem futuro. Ao invés de se introduzir
na minha família, tinha inveja de mim por tê-los quando preciso.
Mesmo assim, no dia 21 de Julho
de 2010, me casei com ela para que pudesse permanecer no Brasil e adquiri visto
permanente que a permitiria trabalhar legalmente. Ela o fez mas não gostou do
fato de se casar com alguém tão incompetente, ignorante e sem futuro como eu.
No final daquele ano, ela perdeu
o emprego na escola de idiomas do qual trabalhava. Ao invés de aceitar minhas sugestões
e minha ajuda para trabalhar na empresa onde meu irmão trabalha ganhando um salário
consideravelmente ótimo, resolveu que a perda daquele emprego implicava uma
aversão à cidade toda. Queria se mudar para São Paulo, a cidade mais violenta
do Brasil. Sem me consultar, procurou emprego pela internet e foi a uma
entrevista. Conseguiu a vaga e não perguntou minha opinião sobre aquilo, apenas
aceitou. Sabendo que minha opinião de nada valia eu fiz o que podia fazer:
acompanhá-la para garantir sua segurança e salvar nosso relacionamento. Deixei meu
emprego onde acabara de ser promovido a gerente e fui para São Paulo. Ela
exigiu de mim que eu encontrasse primeiro um apartamento para depois procurar
emprego. Entre as exigências estavam a ordem de que este novo lar fosse a 5
minutos de distancia a pé até alguma estação de metrô da linha verde. Não
poderia ser perto da linha azul, nem vermelha, nem cinza nem amarela. Tinha que
ser da verde. Não poderia ser 6 minutos de distancia da estação, tinha que ser
ATÉ 5, não mais do que isso. Este apartamento DEVERIA ser mobiliado e não
poderia ser antigo. Também não poderia ser num andar muito alto.
Seguindo sua lista de exigências
encontrei um apartamento do qual eu simplesmente não sabia como faria para
pagar o aluguel. O lugar mais barato que encontrei que se encaixasse em suas exigências
custava um braço e uma perna. Encontrei um trabalho numa operadora de telefonia
móvel. Um emprego do qual ela julgava medíocre e fazia questão de me culpar por
não ganhar o mesmo salário que ela.
Com meu salário eu deveria pagar
o aluguel exorbitante, as contas da casa, comprar comida, levá-la para comer
fora, levá-la ao cinema, levar para viajar de vez em quando, e dar presentes a
ela. Para manter este padrão de exigências, fui fazendo intermináveis empréstimos
em praticamente todo banco que existe no Brasil. Hoje sou até jurado de morte
por estes bancos. Mesmo assim ela achava aquela vida miserável e infeliz pois
eu não poderia prove-la do conforto que ela julgava adequado a seu padrão. Eu
não poderia levá-la a viagens por toda a America. Eu não poderia pagar um
apartamento maior. Com isso, eu era um merda. Em momentos de conflito, levava
até murros dela.
Ela me convenceu de que eu era um
merda. Convenceu-me de que eu não prestava, que era um péssimo marido, um
pobre, um nada. Minha auto-estima não era baixa.... ela simplesmente não
existia mais. Ela era minha musa e eu era uma partícula de poeira. Esqueci quem
sou, desacreditei em qualquer elogio que recebi durante minha vida. Odiava a
mim mesmo por não suprir as necessidades dela.
Para tornar nossa comunicação melhor, aprendi o idioma dela. Duas vezes por semana eu saia exausto do trabalho as 6 da tarde para apahar o metrô lotado da hora do rush até o bairro do Bom Retiro, para estudar o coreano.
Para tornar nossa comunicação melhor, aprendi o idioma dela. Duas vezes por semana eu saia exausto do trabalho as 6 da tarde para apahar o metrô lotado da hora do rush até o bairro do Bom Retiro, para estudar o coreano.
Ela disse que iria visitar Buenos Aires
e não queria esperar 2 semanas até eu ter folga para ir com ela. Foi sozinha.
Depois disso ainda foi para Curitiba.
Reservou uma viagem de 1 mês para
o deserto do Atacama, no Chile, para participar do Amazing Race do Discovery Channel.
Não me consultou sobre isso. Disse que voltaria um dia depois do meu
aniversário. Eu senti que não valia 1 centavo para ela. Senti que não valia 1
centavo para este mundo.
Terminei o relacionamento porque
um dia conversei com meu pai em um sonho e poucos dias conversei com outra
pessoa do “outro lado”. Ele disse que eu teria uma vida infeliz ao lado dela.
Que ela me trairia em 2012. Que eu morreria por causa dela. Que eu não faria
nada que deveria fazer na minha vida por causa dela.
Isso foi no começo de Novembro de
2011. Eu conversei com ela e contei que iria embora. Ela demonstrou
indiferença. Eu ainda propus levá-la a praia como havia prometido, ao parque de
diversões em outra cidade e passar o Natal e Ano Novo com ela para que não
ficasse sozinha naquelas datas. No Natal ela brigou comigo porque dei a ela uma
panela elétrica de 150 reais. Disse que sou estúpido, pois ela não usaria por
muito tempo. Eu ganhei um jogo de canetas femininas de gel, uma mochila que ela
ganhou no trabalho e um lápis. Ela não gastou 1 centavo. Pouco antes do Ano
Novo eu estava tão nervoso que comecei a ter gastrite nervosa com dores
insuportáveis no estômago, vômito e muita febre. Ela ignorava aquilo e não
queria ir à farmácia para mim. Fui à farmácia sozinho mal podendo me mover e
vomitei no meio do caminho.
Além disso, descobri que ela
mentiu sobre ter cortado relações com seu amante de 56 anos. Ela vinha mantendo
contato com ele desde aquela época na Inglaterra. Eles se tratavam como
namorados. Ele sempre mandou dinheiro e presentes para ela. Ela sempre me disse
que eram da mãe e da irmã. Ela contava sua vida comum à ele, sem me incluir.
Como se vivesse sozinha.
Fui embora no dia 2 de Janeiro de
2012.
Mantivemos contato por telefone
pelos próximos quatro meses. Ela me ligaria chorando dizendo que se arrependera
por tudo que fez. Ligava-me todos os dias e eu conversava com ela com paciência.
Tentava ajudá-la a não se sentir sozinha ou deprimida. Dizia que podia ligar
quando quisesse. Ligava para ela para assegurar que estava bem. Quando ela
conheceu um coreano e começou a se relacionar com ele, não quis mais falar
comigo. Não me contou sobre o rapaz. Apenas me ofendia pelo telefone e cortava
contato. Apagou sua conta do Skype, Facebook, Orkut, MSN, Yahoo Messenger...
No dia 23 de Junho de 2012 veio a
minha cidade para fazermos o divorcio. Eu propus que ficasse hospedada na minha
casa. Gastei quase 100 reais no supermercado para comprar comidas que ela
gosta. A levei em restaurantes. A tratei como uma hospede 5 estrelas. Não
briguei, não julguei, não ataquei. Propus mantermos amizade. A elogiei e disse
tudo que ela tem de bom. A beijei, abracei milhares de vezes. Disse que se ela
tentasse melhorar certas coisas, seria uma pessoa ainda mais fantástica. Ela
disse aceitar mas no momento que embarcou no ônibus de volta à São Paulo jogou
seu sim card fora e apagou sua conta de e-mail. Encerrou as últimas 2 formas de
termos qualquer contato. Logo depois descobri sobre seu namorado coreano e que
ela irá para a Inglaterra em Setembro para passar uma temporada com seu amante
de 56 anos.
Eu fiquei mal.... muito mal.
Comecei a perder fome, a vontade de ver pessoas, de trabalhar, de sair da cama.
Tinha flashbacks dos momentos bons. Ficava me culpando, procurando os momentos
onde errei. Sentia-me jogado fora. Fiquei doente os amigos sumiram e estive a
ponto de perder o emprego.
Mas o momento que decidi melhorar
foi crucial. Algumas pessoas auxiliaram e auxiliam muito nisso. Deram-me um
empurrão, me chacoalharam e disseram “Acorda, Julian!”
Comecei a reler este blog e relembrar
quem eu era. Senti falta das minhas idéias, do meu modo de viver, da minha inteligência,
dos meus hobbies, de escrever, de conversar, de parecer doido, de ser
interessante para alguém, de descobrir coisas...
Então aqui vou eu novamente.
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