07/05/2007

Dez Real

De onde venho às pessoas eram presentes diretamente na vida umas das outras. Era, no passado, uma cidade onde praticamente todos se conheciam e com isso vêm aquele desagradável sentimento de falta de individualismo, aquele necessário na nossa vida. Mas não permaneci lá tempo suficiente para me tornar assim, nos anos decorrentes vivi em uma cidade bem maior. Nessa época que você ainda está definindo sua personalidade, você pega traços da sociedade em que vive para formar seus próprios valores. Digamos que eu fiz o possível para tornar meus valores únicos, e não para ser diferente, mas por saber dosar os caminhos incorretos que criamos para si. Talvez um desses valores seja a idéia da responsabilidade que temos sob a vida humana. Eu via que quanto mais as pessoas se acostumassem com a morte brutal de um assassinato, suicídio um homicídio ou latrocínio, elas também se acostumava com a idéia que isso é normal. Mas não se pode acostumar com a morte.
Lembro que um dos meus primeiros contatos com essa violência urbana foi quando fui assaltado pela primeira vez. Eu estava com meu irmão, demos 10 reais para um maldito viciado. Eu tinha 13 ou 14 anos, mas lembro bem de esconder ao máximo a raiva que senti disso. Não por ser assaltado, mas por ver alguém que me importo tendo a vida ameaçada por um verme suburbano. Depois desse assalto, ainda sobrevivi a mais 13, mas por mais que eu fosse ameaçado com um revolver ou uma faca eu ficava apavorado quando alguém da minha casa chegava dizendo que foi assaltado. Minha vontade era de sair pela porta atrás do desgraçado com uma barra de ferro e faze-lo pedir desculpas. Talvez esses fatos tenham sido o que criou a violência que aprisiono ao máximo dentro da alma, tendo ela escapado algumas vezes tempos passados.
Certo dia eu estava andando pelo comércio da cidade e vi um alvoroço na frente de um edifício empresarial. Um certo funcionário desta empresa, cuja função era permanecer no elevador levando as pessoas para cima e para baixo, e cansou de pagar contas e gastar todo seu salário com sua própria sobrevivência e resolveu se atirar do 11º andar, tendo o azar de antes de atingir o chão ainda cair sob o letreiro da empresa que ficava na entrada do prédio. A polícia bem tentava esconder a cena do qual todos em volta tinham a grotesca curiosidade de ver, mas quando os oficiais precisaram tirar fotos tiveram que levantar o pano que estava sob o corpo. Aquilo foi bem horrível, eu mesmo preferia não ter olhado, o sujeito virou uma panqueca e parecia que alguém colocou ele dentro de um microondas, pois ficou todo deformado e com os membros todos desordenados, com um pé do lado da cabeça, etc.
Algum tempo depois eu estava indo a algum lugar e andava numa grande avenida da cidade, passei do lado do prédio do CityBank. Tive a falta de sorte de passar bem na hora que alguém estava fugindo do banco com uma arma na mão. Eu ouvi alguém gritando para parar e olhei para trás, pela porta do prédio saiu um sujeito correndo, carregando uma arma e atrás dele outro sujeito apontando uma arma. Eu era a pessoa mais próxima dos dois, o prédio ficava de esquina e eu estava na esquina. Meu coração pausou por um momento e eu gelei. Não consegui abaixar, correr, fazer porra nenhuma. O primeiro cara parou, temendo levar um tiro e o outro o rendeu. Decisão certa, rapaz! Até hoje não sei o que estava acontecendo lá, pois o cara estava bem-vestido demais para ser um assaltante de banco. E ninguém rouba um banco sozinho. Depois daquele fato eu me policiei para nunca mais paralisar em momentos de tensão. Afinal quando eu estiver casado e com filhos e extraterrestres descerem no meu quintal eu não vou poder me paralisar de nervoso.
Alguns anos depois escolhi deixar aquela cidade, grato por tudo que aprendi lá, inclusive sobre os extraterrestres. Mas estando agora numa cidade muito menor, percebo as diferenças sociais presentes, que de certo modo sempre acabam me atingindo. Algumas pessoas me disseram que não sou muito comunicativo com desconhecidos. Disseram que sou objetivo demais, muito sério e não muito sociável. Não posso obrigar ninguém a entender, mas eu sempre vivi no centro de uma mega-cidade, não morei no subúrbio, morava num lugar onde não sabemos o nome do vizinho, nem a cara dele. Pessoas desconhecidas não trocam muitas palavras, pois você não sabe se ela vai ameaçar sua vida em 2 minutos.
Eu não faço o perfil de quem gosta de morar no subúrbio, conversar com os vizinhos e ir à padaria de Havaianas. Odeio andar devagar na rua, fazer as coisas devagar e esperar. Eu gosto de morar em apartamento, em áreas urbanas, e não gosto de conversar muito com quem não conheço, principalmente com homem. Por tudo isso me considero um Anti-Social. São todas as características de alguém que vai morrer cedo.
Será que um dia vou casar? Deve existir alguma mulher que não quer viver no subúrbio.

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